Os parâmetros mais utilizados para avaliar a qualidade do trigo duro podem dividir-se em dois grupos consoante a análise ao grão é de caráter físico (massa do hectolitro, vitreosidade e massa de 1000 grãos) ou químico-tecnológico (teores de proteína, glúten, cinzas, carotenos – pigmentos amarelos e rendimento em sêmola).

Análises físicas do grão

  • Massa do Hectolitro

Este parâmetro expressa a massa volúmica de um determinado lote de trigo em kg.hl-1 e relaciona-se estreitamente com a densidade do grão. É um indicador muito antigo e foi desde muito cedo usado para discriminar o valor comercial do grão no momento em que era vendido. A massa do hectolitro é um parâmetro ligado ao volume do endosperma do grão, mas pode ser influenciada por vários fatores, tais como espaços intercalares vazios, o teor de humidade e a natureza e quantidade de impurezas presentes na amostra.

  • Vitreosidade

O caráter vítreo é um parâmetro importante no caso do trigo duro (Figura 1). Uma maior presença de grãos não vítreos (bragados ou farináceos) produz, no processo industrial (Figura 2, menor quantidade de sêmola e maior quantidade de farinha, a qual, no caso do trigo duro é considerada um subproduto. Para além disso, também está associada ao aparecimento de defeitos de coloração ao nível das massas alimentícias (pontuações brancas).

A presença de humidade durante a fase final da maturação do grão, quer pela ocorrência de chuva ou por irrigação, pode contribuir para a perda do caráter vítreo.

Figura 1. Grãos de trigo duro vítreos (à esquerda) e bragados (à direita).
  • Peso de 1000 grãos

O peso de 1000 grãos está diretamente relacionado com o tamanho e com a densidade de cada grão. Por sua vez, o tamanho e a densidade dos grãos dependem, sobretudo, da variedade e das condições ambientais (Figura 2), principalmente durante o período de enchimento e maturação dos grãos.

Figura 2. Efeito ambiental (stress hídrico) verificado num ensaio a 9 de maio de 2017, INIAV – Polo Elvas, com consequências no tamanho e peso do grão.

Análise das características químico-tecnológicas

  • Proteínas do grão

A quantidade e a qualidade das proteínas são parâmetros que avaliam o potencial da sêmola em relação ao seu uso final. As propriedades reológicas das massas dependem destes dois parâmetros. Um elevado teor proteico não assegura por si só uma boa qualidade, que depende também da composição e interação das proteínas que formam glúten. A percentagem de proteína apresenta uma grande variabilidade intraespecífica como consequência da grande interação entre o genótipo e o ambiente. Para algumas variedades de trigo duro, as aplicações de azoto mais tardias aumentam o teor de proteína do grão.

  • Glúten

O glúten é uma rede viscoelástica contínua que é formada quando se trabalha uma mistura de sêmola e água, que retém os restantes constituintes, garantindo a estrutura e integridade dos produtos finais. É um complexo de grandes dimensões constituído por cerca de 80% da proteína total do endosperma do trigo, maioritariamente gluteninas e gliadinas. As primeiras são responsáveis pela elasticidade e força do glúten, enquanto as segundas estão mais relacionadas com a sua extensibilidade e viscosidade (Figura 4).

Um glúten forte é considerado um pré-requisito fundamental para a obtenção de massas de qualidade superior.

Figura 3. Importância de um glúten forte para a coesão da massa.
  • Cinzas

Representam a percentagem de sais minerais presentes no grão de trigo, os quais se localizam maioritariamente nas camadas exteriores do grão. A sua quantificação é de grande importância industrial.

É considerado um critério de pureza das sêmolas, para o qual existe um limite legal que condiciona a taxa de extração e o teor de cinzas no próprio grão que é usado como matéria-prima (Figura 4). Desta forma, o rendimento em sêmolas é geralmente maior à medida que a percentagem de cinzas é menor.

Teores de cinzas no grão elevados também estão associados ao aparecimento de defeitos de coloração ao nível das massas alimentícias (pontuações negras).

Figura 4. Processo de obtenção das cinzas (combustão).

O conteúdo em minerais no grão pode ser influenciado por fatores genéticos, pelo solo (natureza do solo, riqueza em matéria orgânica e disponibilidade de nutrientes), pelo clima (radiação, temperatura e humidade), por técnicas culturais (densidade de sementeira e adubações), por parâmetros fisiológicos (maturação do grão à colheita e doenças) entre outros.

  • Rendimento em sêmola

O rendimento em sêmola é um importante critério de qualidade do trigo duro, uma vez que a quantidade e homogeneidade da granulometria da sêmola obtida, condicionará a qualidade das massas alimentícias produzidas (Figura 5). A relação entre a massa do hectolitro e o rendimento em sêmola é amplamente utilizada como indicador do potencial industrial do trigo.

Figura 5. Rendimento em sêmolas obtido do grão.
  • Pigmentos amarelos

A alta concentração de pigmentos amarelos é uma característica muito importante em grãos de trigo duro. A cor amarela do endosperma dos grãos é apreciada pelas indústrias de massas por dois motivos: i) torna esses produtos mais apelativos para o consumidor e ii) oferece benefícios para a saúde, associados aos carotenoides, que possuem atividade antioxidante. No grão do trigo duro o pigmento que se encontra em maior quantidade é a xantofila-luteína, que é responsável por 80 a 90% de todos os carotenoides, correspondendo os 10-20% restantes à luteína esterificada e aos carotenos (Panfili et al., 2004).

A qualidade do trigo duro é assim definida por uma ampla gama de parâmetros físicos, químico-tecnológicos e sanitários, extremamente influenciados pela interação de fatores como a variedade, o solo, o clima, as técnicas culturais ou mesmo as condições de armazenamento do grão. A especificidade deste cereal para apenas um tipo de utilização – o fabrico de massas alimentícias, aumenta ainda mais a sua complexidade.

Panfili, G., Fratianni, A. y Irano, M. (2004). Improved normal-phase high-performance liquid chromatography procedure for the determination of carotenoids in cereals. Journal of Agricultural and Food Chemistry, 52(21): 6373-6377.